Na Medida do Bom Senso

O feminismo e o bom senso

Nos últimos dias o debate sobre assédio sexual ficou mais acalorado. Desde que as atrizes compareceram à recente cerimônia de premiação do Globo de Ouro trajando preto para denunciar o assédio sexual sofrido em Hollywood, que teve como ápice o discurso da apresentadora e atriz Oprah Winfrey contra o machismo, a mídia e as redes sociais não falam de outra coisa.

Para jogar mais lenha nesta fogueira, dois dias depois a atriz francesa Catherine Deneuve e outras 99 mulheres influentes na França –  intelectuais, artistas e acadêmicas –  publicaram no jornal Le Monde um manifesto defendendo o direito dos homens “cantarem” as mulheres, afirmando que a liberdade em importunar é indispensável à liberdade sexual e que essa febre de enviar “porcos”, leia-se aqui, homens, ao matadouro, longe de ajudar as mulheres a serem mais autônomas, serve realmente aos interesses dos inimigos da liberdade sexual, dos extremistas religiosos, dos piores reacionários.

Por último, para não ficar de fora, a escritora Danuza Leão publicou ontem no jornal O Globo um texto apoiando Catherine e suas amigas, afirmando, entre outras coisas, que toda mulher deveria ser assediada pelo menos 3 vezes por semana para ser feliz, o que causou muita polêmica e manifestações contrárias, inclusive de seus netos.

Em meio a discursos feministas e antifeministas, é importante entender o que está sendo dito e formar a própria opinião sobre o tema. Segue a minha opinião, a quem interessar possa:

1. Denunciar o assédio sexual no ambiente de trabalho

Se opor e denunciar assédio é um direito do funcionário que as empresas devem acatar com seriedade e profissionalismo. Homens e mulheres que fazem uso de seus cargos e do poder que lhes é conferido para obter favores sexuais devem ser punidos exemplarmente. Quanto a isso não há discussão.

O que não pode: generalizar  –  Muitas empresas temendo uma onda de processos estão elaborando cartilhas de “boa conduta” que proíbe caronas, almoços e reuniões às portas fechadas entre um homem e uma mulher. Proíbe também elogios à roupa, ao perfume ou a forma física.  Este tipo de “manual” com certeza não é a solução, toda mulher deve saber impor limites quando o galanteio não lhe agrada. Se não existe a ameaça do assédio, um bom “chega pra lá” resolve a situação, se o sujeito for inconveniente e insistente o Recursos Humanos deve estar preparado para, se acionado, lidar com a situação. É preciso saber diferenciar o flerte ou uma cantada infeliz do assédio sexual, afim de se evitar atitudes levianas que possam prejudicar outras pessoas. Leia aqui o que dizem alguns especialistas sobre o assunto: http://www.bbc.com/portuguese/brasil-41700176

2 .  Quando “Importunar é indispensável à liberdade sexual”

O que Catherine Deneuve e as 99 mulheres quiseram dizer com a carta publicada no jornal, na qual se destaca a frase acima, é que faz parte da natureza do macho, de qualquer espécie, conquistar e seduzir. As fêmeas, de qualquer espécie, têm a prerrogativa de aceitar ou recusar a investida. Do ponto de vista biológico isso é verdade, do ponto de vista humano e social, nem sempre. Deneuve afirma ainda que a onda de denúncias estimuladas pelo movimento #MeToo nos Estados Unidos e  #Balancetonporc na França, induz a percepção que as mulheres são impotentes e eternas vítimas. Elas afirmam ainda que esta onda de feminismo vai gerar um ódio aos homens e a sexualidade.

O que não pode: generalizar  –  Achar normal um homem, sem ser convidado, tocar o joelho de uma mulher ou forçar um beijo só porque ele é homem e porque tais atitudes fazem  parte de sua natureza e do jogo da sedução, soa bem estranho e equivocado nos dias atuais.  Mas, por outro lado, entender todo elogio ou gesto de cavalheirismo como uma agressão machista, também gera distorções e equívocos. Bom senso e equilíbrio emocional são fundamentais nestas horas.

“…É ótimo passar em frente a uma obra e receber um elogio. Sou desse tempo. Acho que toda mulher deveria ser assediada pelo menos três vezes por semana para ser feliz. Viva os homens.” – Danuza Leão

Tem gosto para tudo. Eu particularmente não gosto de grosserias e vulgaridades, ainda que venham sob a forma de elogio.

O que não pode: ser irresponsável.  Na minha opinião Danuza Leão foi irresponsável em seu texto publicado no jornal O Globo. Ela afirmou não saber a diferença entre uma paquera e um assédio, classificou como “caça às bruxas” as denúncias de assédio sexual e ridicularizou o movimento das atrizes no Globo de Ouro, afirmando que apesar de lindíssimos os vestidos pretos deram um ar de funeral à cerimonia de premiação. É lamentável que um espaço num importante veículo seja desperdiçado com um pensamento machista e retrógrado que reforça a conduta deplorável de muito homens.

A luta contra o assédio sexual é válida e justa e não pode ser classificada de causa feminista. Homens e mulheres de bem devem se unir para combater distorções em qualquer tipo de relação, seja ela profissional, de amizade ou afetiva. É necessário evitar os extremos e as histerias. Muitas mulheres precisam entender que lutar pela igualdade de direitos não é declarar guerra ao sexo oposto, generalizando as más atitudes. Mulheres versus Homens enfraquecem as relações e a sociedade. Mulheres & Homens constroem um mundo melhor e mais digno para todos, no presente e no futuro.