Perséfone é uma mulher de trinta e poucos anos, embora aparente bem menos. Meio riponga, meio bicho grilo, ela mantém os cabelos castanhos e encaracolados até um pouco abaixo da cintura, apesar da sua idade. Usa vestidos longos, ligeiramente rodados. Nos pés somente rasteirinhas e sapatilhas.
Sua beleza discreta definitivamente não chama atenção, apesar de seu rosto ter traços delicados e harmoniosos e seus olhos serem expressivos e verdes como esmeraldas.
Vegana convicta, guarda suas razões para si própria. Jamais tenta converter os outros. Aliás, nem na alimentação e nem na crença espiritualizada, que ela cultua com devoção.
Perséfone não pratica nenhuma religião, sua fé inabalável é em Deus e sobretudo em toda a Sua criação. Segue sem titubear sua aguçada intuição. Seus medos não são originários do mundo físico, do qual ela parece viver apartada na maior parte do tempo. Ela tem cisma mesmo é com energias negativas, mau-olhado e espíritos malignos. Assim, quando a sua intuição diz que está sendo vítima de algum destes malefícios, usa tudo o que sabe para se proteger: banhos energéticos, incensos, salmos, velas para o anjo da guarda e orações pedindo proteção aos seres de luz.
Estar só para Perséfone não é motivo de tristeza. Ao contrário, a solidão para ela é um bálsamo que alivia seus tormentos, difícil mesmo é viver em sociedade. As regras de conduta social, repletas artimanhas e jogos de interesses, a deixam confusa e ao mesmo tempo constrangida. As relações efêmeras da atualidade não lhe agradam e a vida falsamente glamorosa das redes sociais a cansam. Resumindo, uma mulher fora de contexto.
Certamente seu perfil arredio não ajuda em nada a sua caótica vida amorosa. Uma coleção de casos frustrados e amores platônicos.
O último deles foi Caique, um cara meio tímido e introvertido que ela conheceu numa ONG, onde é voluntária. Primeiramente aconteceu a troca de olhares que de tão intensa deixou os dois vermelhos. Na semana seguinte trocaram algumas palavras durante o trabalho e em seguida marcaram de se encontrar. Em um mês estavam morando juntos. Tudo muito rápido, intenso e tresloucado, assim como as emoções de Perséfone.
Na intimidade, em pouquíssimo tempo, Caique se mostrou um cara instável, parecia que vivia no limite das emoções. Ia de um extremo a outro num piscar de olhos. Às vezes, num único dia ele apresentava muitas variações de humor. Na sua maioria intensas e desproporcionais com a realidade. Não demorou muito tempo para Perséfone entender que ele sofria de algum transtorno de personalidade. Com muita sutileza ela sugeriu que ele procurasse ajuda, mas não se surpreendeu com a negativa dele. Resolveu dar mais um tempo.
Não adiantou. Sua intuição feminina gritava para que ela saísse daquele apartamento. Acostumada a acatar as mensagens que, segundo ela, seus protetores lhe enviavam, uma noite ela esperou ele adormecer e silenciosamente pegou sua mala. Chamou um motorista pelo aplicativo do celular e rumou para o aeroporto.
Hoje, no Osho Gangadham, um dos mais conhecidos ashrams da Índia, Perséfone faz seu retiro espiritual, sem data certa para o retorno ao Brasil. Assim é Perséfone.